segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Estado de Direito e Enriquecimento Ilícito

As conversas gravadas e divulgadas pela comunicação social, do Eng.º Sócrates com o Dr. Armando Vara, colocaram o Primeiro-ministro sob suspeição.
Lamento que o Procurador Geral da República tenha decidido não abrir inquérito para averiguar sobre eventuais indícios da prática de crimes contra o Estado de Direito e que o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça tenha mandado destruir as gravações, pelo facto de as conversas terem sido obtidas sem a sua prévia autorização.
A lei impõe que o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro-ministro não possam ser escutados sem autorização do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
É evidente que os polícias que investigavam uma rede de corrupção, onde o amigo do Primeiro-ministro era suspeito, não imaginaram que o Primeiro-ministro viesse a ter conversas telefónicas com esse individuo.
Muito menos terão imaginado gravar conversas com o Primeiro-ministro que o colocassem como suspeito e como tal não solicitaram, previamente, autorização para realizarem as escutas.
Grave não é o Primeiro-ministro ter sido “escutado” em conversas com um amigo suspeito de tráfico de influencias e corrupção.
Grave é ter conversas que o colocam como suspeito.
Grave é o facto do conteúdo das escutas ter sido mandado destruir pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Grave é o facto do Procurador não ter recorrido desta decisão do Presidente do Supremo, que é considerada ilegal por alguns dos melhores juristas e penalistas portugueses.
Segundo as notícias vindas a público, numa das conversas o eventual corruptor terá exigido a substituição da anterior Secretária de Estado dos Transportes.
Curiosamente a senhora deixou de pertencer ao Governo saído das últimas eleições.
Esta secretária de Estado, que esteve muito ligada ao processo de lançamento da obra do Metro Mondego, pela sua actuação ganhou fama de pessoa séria e competente.
De nada lhe valeu. Deixou de pertencer ao Governo. Parece que o pedido do sucateiro, aparentemente de poucos escrúpulos, teve muita força.
Portugal não merece viver esta telenovela a roçar a comédia.
A corrupção é a doença mais grave da nossa democracia. A corrupção é um dos grandes óbices a que Portugal tenha uma economia e um estado social de bem-estar semelhante ao dos países do norte da Europa.
A organização internacional que estuda a corrupção nos diferentes países, na última classificação divulgada, colocou-nos em 35º lugar, piorando três posições relativamente ao ano passado.
Quando devíamos estar a melhorar no combate e na prevenção aparecemos internacionalmente como um pais que deixa agravar a corrupção.
Nos últimos tempos verificámos que algumas das nossas elites adoptam comportamentos egoístas, dependentes duma ambição material insaciável.
Todos nós temos conhecimento de gente, importante e “insuspeita”, que após iniciar uma carreira política, apareceram como empresários de sucesso, cheios de dinheiro.
Não é só na política… Há outras áreas onde de repente, do nada, aparecem pessoas que se comportam como detentores de posses que ninguém sabe onde ou como as terão obtido.
Com a nossa actual legislação nunca terão de explicar como conseguiram esse dinheiro.
A polícia nunca descobriu qualquer crime que os envolva ou se teve suspeitas nunca conseguiu qualquer prova. São gente “séria”, influente, que aparenta mandar nos partidos e nos Governos.
Duas medidas são fundamentais para que a justiça possa actuar nestes casos: O fim do sigilo bancário e a criminalização do enriquecimento ilícito.
O PS e o Governo têm mostrado a sua oposição à hipótese duma alteração legislativa que criminalize o enriquecimento ilícito.
Aparentam querer que as coisas continuem com estão, permitindo que Portugal seja um paraíso para criminosos de gravata.
O PS e o Eng.º Sócrates nunca deram ouvidos ao Eng.º Cravinho e ao seu pacote legislativo contra a corrupção.
Quer o PCP quer o PSD têm anunciado a intenção de criar legislação que criminalize o enriquecimento ilícito, com penas pesadas, de prisão e de perda de património.
Esperamos que os restantes partidos, incluindo o CDS, possam dar as mãos para implementar esta legislação que, nem o Governo, nem os criminosos desejam.
(Publicado no Diário de Coimbra em 01.12.2009)

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