quinta-feira, 8 de abril de 2010

Eles Comem Tudo... e não Deixam Nada

Portugal vive uma situação social, económica e política lamentável.
A crise económica mundial agravou as nossas dificuldades financeiras, obrigando o Governo a apresentar o PEC (Plano de Estabilidade e Crescimento).
É um documento com muitas propostas para apertar o cinto mas sem ideias para aumentar o produto nacional.
O governo anunciou o congelamento de salários, a redução do rendimento dos reformados, a alteração das regras de aposentação, os cortes no número de trabalhadores no estado, etc.
Nem uma palavra disse sobre o escândalo dos ordenados milionários dos gestores por si nomeados para empresas de capital público ou misto ou para aquelas onde detém uma posição de “golden share”, onde o Estado tem poder efectivo.
Silêncio mais chocante porque o Governo vai congelar os benefícios sociais, a começar pelo abono de família, sendo certo que temos de incentivar a natalidade e apoiar as famílias.
Para poupar, o Governo vai impor restrições ao rendimento mínimo para as pessoas mais carenciadas e vai reduzir os direitos dos desempregados, como se fossem eles os culpados da falta de empregos e da redução de postos de trabalho.
O comportamento do Governo, ao permitir estes salários “pornográficos”, incentiva as greves.
Os trabalhadores sabem que vivemos uma crise.
Se o Governo desse bons exemplos os sindicatos seriam os primeiros a aceitar alguns cortes.
Como, ao mais alto nível, os administradores se comportam como oportunistas gananciosos, não se pode pedir aos sindicatos para cancelarem as reivindicações.
Infelizmente nem todas as profissões tem a mesma capacidade reivindicativa.
Os professores conseguiram vergar o Governo. Os enfermeiros estão em luta por benefícios que parecem excessivos neste período de dificuldades. Os pilotos da TAP, que ganham salários muito a cima de cinco mil euros mês, abusam do seu poder.
Se o Governo desse o exemplo impondo cortes aos beneficiários dos salários milionários então seria legitimo exigir a todos os sindicatos (professores, enfermeiros, pilotos, ferroviários, etc.) que não abusassem da sua posição de força.
Não é possível tolerar que, num país com dificuldades, os administradores da Portugal Telecom (PT) tenham recebido em 2009 11,4 milhões de euros em salários e prémios.
Só três deles, Granadeiro, Bava e o “miúdo” Rui Pedro Soares, obrigado a demitir-se no seguimento do escândalo Face Oculta, receberam 5,6 milhões de euros.
É bom recordar coisas simples. Um milhão de euros são mil ordenados de mil euros, mais de dois mil e cem salários mínimos.
Em Portugal vivem mais de trezentos mil idosos reformados, com pensões inferiores a 300€.
Um milhão de euros equivale a três mil, trezentos e trinta e três destas reformas.
Eles comem tudo... e não deixam nada!
Muitos de nós nos lembramos deste verso de uma balada interpretada pelo Zeca Afonso contra as elites da ditadura.
Nunca a canção esteve tão actual!
Urge pôr cobro a esta “pornografia” salarial do Governo!
(Publicado no Diário de Coimbra em 06.04.2010)